Pesquisas no Centro de pesquisas de Viamão apontam para a descoberta de um cruzamento natural entre diferentes espécies de butiazeiro
Recentemente, o início da produção de frutos de mudas oriundas de um mesmo cacho coletado de uma planta matriz no município de Santa Maria revelou exemplares com características de duas espécies diferentes de butiazeiro

Pesquisas no Centro de pesquisas de Viamão apontam para a descoberta de um cruzamento natural entre diferentes espécies de butiazeiro - As características dos frutos e cachos são grandes, acima da média
Pesquisas desenvolvidas em Banco de Germoplasma (BAG) de butiás, no Centro Estadual de Diagnóstico e Pesquisa em Aquicultura (CEPAQ) de Viamão, da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), têm revelado dados inéditos sobre o butiazeiro e suas diferentes espécies. Recentemente, o início da produção de frutos de mudas oriundas de um mesmo cacho coletado de uma planta matriz no município de Santa Maria revelou exemplares com características de duas espécies diferentes de butiazeiro, Butia odorata e Butia yatay.
Inicialmente, essa matriz de Santa Maria, com características de B. odorata se destacou pelo tamanho dos seus frutos "gigantes", com mais de 50 gramas e cachos alcançando 40 Kg. Mas foi a partir do plantio de 12 mudas desta matriz (progênies) no BAG de Viamão, que depois de oito anos, quando começaram a produção dos primeiros cachos, que essas plantas revelaram, além de frutos muito graúdos, padrões morfológicos distintos entre os seus descendentes, sendo alguns com frutos típicos de Butia odorata, e outros indivíduos apresentando características de Butia yatay. A Butia yatay ocorre naturalmente na região oeste do Rio Grande do Sul e a Butia odorata cresce na região central e leste do estado.
"Esse fenômeno se deve muito provavelmente ao cruzamento natural destas duas espécies, uma vez que a planta matriz onde as sementes foram coletadas e que deram origem às mudas, está situada nas proximidades da área de contato entre essas duas populações (espécies), o que deve ter contribuído para o surgimento deste híbrido", destaca o pesquisador do DDPA Gilson Schlindwein, do Centro de Viamão. Segundo ele, os estudos genéticos estão sendo conduzidos nas matrizes (progênies) do BAG de Viamão para confirmação deste cruzamento.


E algumas hipóteses devem ser pesquisadas no Banco, afirma Gilson, entre elas: "será que plantas com tamanho de frutos e de cachos muito acima da média, encontradas na região de Santa Maria, são resultantes do cruzamento entre duas espécies distintas?".
O Banco de Germoplasma de Butiazeiros e a produção de mudas - Implantado em 2008 no Centro de Pesquisa de Viamão, o primeiro Banco de Germoplasma de Butiazeiros (BAG-butiá/Viamão) é resultado de pesquisas desenvolvidas pelo DDPA/Seapi, com o objetivo de reproduzir e manter indivíduos raros de diferentes espécies de butiazeiros, as quais também se encontram em situação de risco de extinção.

A partir da sua implantação têm sido incorporados periodicamente novos os e espécies de butiazeiros de matrizes de diferentes regiões do Estado para fins de conservação, propagação e avaliação de matrizes. Esta área é composta atualmente por 300 indivíduos, com metade das plantas em ciclo de produção de frutos.
De acordo com Gilson, "a disponibilização dos diferentes espécimes num mesmo local tem permitido a execução de pesquisas sobre sistemas de manejo da cultura, caracterização genética das espécies, avaliações de produção e qualidade dos frutos, além de coletas de sementes para multiplicação de mudas". A área também garante a manutenção de espécimes únicos, com características produtivas diferenciadas.

Atualmente, a área é fonte para diferentes estudos botânicos e genéticos que estão inseridos em projetos de pesquisas com butiazeiros realizados pelo DDPA, além de parcerias com outras instituições de ensino e pesquisa, onde contribui para dissertações de mestrado e teses de doutorado em andamento. A partir da coleta das sementes nesta área foram implantadas mais cinco áreas para produção de sementes (PMS), com o plantio de 100 exemplares de matrizes selecionadas de butiazeiros (Butia odorata) para fins de avaliação e produção de mudas.
Na mesma área são produzidas anualmente duas mil mudas de diferentes espécies e procedências de butiazeiros com características específicas para diversos fins, tais como a produção comercial da fruta, o paisagismo urbano e a restauração ecológica de áreas naturais de ocorrência dessas espécies. *Maria Alice Lussani/Ascom Seapi/Fotos: Fernando Dias/Ascom Seapi - 03/03/2025 - Fone: (51) 3288-6211/6228 - www.agricultura.rs.gov.br
Desde o início do projeto, já foram mais de 4.000 mudas doadas para pomares em 39 propriedades rurais de 24 municípios do Rio Grande do Sul. O destino são pequenos agricultores, agroindústria familiar e assentamentos, entre outros. Mais informações sobre mudas no Laboratório de Sementes de Viamão pelo fone (51) 3288-8030 ou 3288-8037.

Revolução na pesquisa com o butiá - Fruto híbrido de duas espécies nativas tem peso mais de cinco vezes acima do que normalmente é obtido e com sabor mais doce, permitindo melhor aproveitamento para a produção de sucos e outros derivados - Com peso mais de cinco vezes acima do normal e de sabor mais doce, um fruto de butiazeiro, surgido em um centro de pesquisa em Viamão, na Região Metropolitana de Porto Alegre, deverá marcar uma nova etapa na atividade extrativista de butiazais no Rio Grande do Sul. Provável resultado de um híbrido das espécies odorata e yatay, a exploração desse novo fruto poderá contribuir para expandir a produção de sucos e alimentos, transformando o extrativismo em uma cultura cultivada, com plantas selecionadas, mais produtivas e com qualidade superior.
O híbrido foi encontrado no Banco de Germoplasma do Centro Estadual de Diagnóstico e Pesquisa em Aquicultura de Viamão, órgão da Secretaria de Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi). As plantas que geraram os frutos são provenientes de mudas retiradas de um mesmo cacho oriundo de Santa Maria, em uma região onde os butiazeiros odorata e yatay convivem como vizinhos.
"Foi um produtor de Santa Maria que nos ajudou a identificá-la. Coletamos sementes e multiplicamos em várias mudas. Nosso objetivo é a seleção de plantas com produção superior", explica o pesquisador Gilson Schlindwein.
Ao todo, o processo demandou oito anos, com Schlindwein e outros quatro colegas aguardando as mudas começarem a produzir para saber se as plantas nascidas ali manteriam as mesmas características. A equipe aposta que está diante de um híbrido surgido do material colhido no município da Região Centro, mas o pesquisador faz uma ressalva. "Ainda não realizamos a parte genética. Para bater o martelo, precisamos do DNA", afirma, referindo-se ao ácido desoxirribonucleico, molécula que contém as informações genéticas de um organismo.
A matriz de Santa Maria, com características de butiá odorata se destacou pelo tamanho dos frutos, com mais de 50 gramas. "O normal não chega nem a dez gramas", revela Schlindwein. Os cachos também apresentam peso excepcional, de 40 quilos. Doze mudas foram plantadas no Banco de Germoplasma, que terminaram por revelar, além dos frutos graúdos, padrões morfológicos distintos entre os seus descendentes, sendo alguns com frutos típicos de odorata, e outros indivíduos apresentando características de yatay. O yatay ocorre naturalmente no oeste do Rio Grande do Sul e o odorata cresce na Região Centro e no leste do Estado.
"O fenômeno se deve muito provavelmente ao cruzamento natural destas duas espécies, uma vez que a planta matriz onde as sementes foram coletadas, e que deram origem às mudas, está situada nas proximidades da área de contato entre as duas populações, o que deve ter contribuído para o surgimento deste híbrido", avalia Schlindwein.
Implantado em setembro de 2008, o primeiro Banco de Germoplasma de Butiazeiros é resultado de pesquisas desenvolvidas pelo Centro Estadual de Diagnóstico e Pesquisa em Aquicultura, com o objetivo de reproduzir e manter indivíduos raros de diferentes espécies da palmeira típica do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e de áreas de Uruguai e Argentina. Os palmares do sul do continente se encontram em situação de risco de extinção, o que tem sido combatido com a atuação do Banco de Germoplasma. As pesquisas do local incorporam, periodicamente, espécies de butiazeiros de matrizes de diferentes regiões do Estado para fins de conservação, propagação e avaliação. Atualmente o acervo reúne cerca de 300 indivíduos, com metade das plantas em ciclo de produção de frutos.
Schlindwein destaca que a disponibilidade de diferentes espécies permite estudos sobre o manejo da cultura, caracterização genética, avaliação de produção e qualidade dos frutos, além de coletas de sementes para multiplicação de mudas. A área também garante a manutenção de espécies únicos, com características produtivas diferenciadas. O trabalho estabeleceu parcerias com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) e a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs), além de 39 produtores localizados em 24 municípios gaúchos.
Duas mil mudas são produzidas anualmente pelo banco, de diferentes espécies e procedências de butiazeiros, com características específicas para diversos fins, tais como a produção comercial da fruta, o paisagismo urbano e a restauração ecológica de áreas naturais de ocorrência das espécies.
RS tem 400 mil plantas em 28 mil propriedades - No total, cerca de 16 mil famílias gaúchas fazem algum tipo de coleta da fruta e, dependendo da quantidade e da qualidade, conseguem processá-la na forma de sucos, geleias, cachaças, licores e polpa
Na atividade extrativista, o potencial econômico oferecido pelos butiazais gaúchos depende hoje do estabelecimento de uma produção regular e de qualidade para incrementar a renda e as possibilidades de exploração por agricultores familiares. "Hoje temos uma cadeia produtiva, principalmente na Região Noroeste, com várias agroindústrias que processam a fruta obtida por extrativismo, buscando plantas que já estavam ali, em pequenas propriedades. Às vezes, falta matéria-prima para alcançar uma cadeia produtiva mais robusta", diz o pesquisador Gilson Schlindwein, do Banco de Germoplasma de Butiás, no Centro Estadual de Diagnóstico e Pesquisa em Aquicultura da Secretaria de Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), em Viamão.
Em 2023, um diagnóstico do setor elaborado pela Seapi apontou que 16.170 famílias realizam alguma forma de coleta da planta no Estado. O estudo indicou ainda que os butiazais cobrem 5,3 mil hectares no Rio Grande do Sul, com 400 mil plantas distribuídas em 28 mil propriedades. Considerando as mais de 16 mil famílias que exploram a riqueza natural, haveria aproximadamente 12 mil imóveis rurais onde não há coleta sequer para consumo próprio. Os frutos são empregados para produção, principalmente, de suco, geleia, polpa e cachaça.
Folhas e sementes são utilizadas em artesanato, com destaque para cestaria. Das 23 espécies existentes no planeta, oito se desenvolvem em terras gaúchas.
"Todas ameaçadas de extinção", salienta Rosa Lia Barbieri, pesquisadora da Embrapa Clima Temperado.
A pesquisadora ressalta o projeto Rota dos Butiazais para contribuir com a superação do ainda baixo aproveitamento da planta e seus frutos. "O objetivo é formar uma rede de instituições e de pessoas interessadas e envolvidas com a questão de conservação e uso sustentável do butiá", explica Rosa. A rota abrange Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Uruguai e Argentina, sob coordenação da Embrapa Clima Temperado. A rota completará uma década de implantação no final de 2025, mas a unidade da empresa de pesquisa dedica atenção à palmeira e seus frutos há quase 20 anos.
"São frutos ricos em vitaminas, principalmente vitamina C e carotenóides também. Têm minerais importantes para nossa saúde, como ferro e potássio. É uma fonte muito rica de potássio", diz Rosa Lia, acrescentando que o butiá tem atividade anti-hipoglicemiante. "Ele consegue baixar, reduzir a quantidade de açúcar no sangue. Tem muitas potencialidades. O sabor dele é muito marcante", afirma. A gastronomia, aliás, é um dos focos mais relevantes no trabalho da Embrapa com a planta, que envolve os esforços de, pelo menos, dez profissionais da entidade.
Em 2021, em parceria com o movimento Slow Food, a Embrapa lançou o livro "Butiá para todos os gostos", com 141 páginas. A publicação reúne dezenas de receitas recolhidas em 14 municípios no Estado, em Santa Catarina, no Uruguai e na Argentina, além de preparos criados por chefes de cozinha e instituições de ensino na área de gastronomia. Licores, compotas, cucas, sagus, trufas, pães e combinações do butiá com carnes estão entre as delícias apresentadas. A edição digital pode ser obtida gratuitamente no endereço https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1139773/butia-para-todos-os-gostos.
Conforme Rosa Lia, hoje restaurantes das regiões metropolitanas de Porto Alegre e Florianópolis (SC), da Serra Gaúcha, incluindo Gramado, oferecem o fruto nas atrações dos cardápios. Um dos fornecedores do insumo para os estabelecimentos é a Cadeia Produtiva Solidária das Frutas Nativas, que atua no Planalto gaúcho. Com uma rede de coletores, a organização obteve, no ano ado, 12 toneladas de butiás, que resultaram, de acordo com a pesquisadora, em cinco toneladas de polpa. A produção foi absorvida pelos restaurantes.
Rosa Lia cita uma pequena agroindústria familiar do município de São José do Inhacorá para exemplificar a viabilidade do butiá no setor alimentício. "Essa agroindústria processou, neste ano, 20 toneladas de butiá, que resultaram em 12 toneladas de polpa. Essa polpa está toda direcionada para a indústria de bebidas", afirma. A iniciativa dispõe da mão de obra de 13 famílias para a extração dos frutos.
"Precisamos abrir mais portas no mercado, mas, para isso, precisamos de uma garantia de produção", diz a pesquisadora.
Na Seapi, uma das apostas para aumentar a produção está em 39 empreendimentos rurais parceiros do Banco de Germoplasma. Conforme Gilson Schlindwein, a secretaria ofereceu mudas para formação de butiazais nessas propriedades. "Alguns pomares têm quatro anos. Estão quase iniciando a produção. Estamos muito curiosos para ver esse início", relata. Mais recentemente, os produtores ficaram empolgados com os butiás de 50 gramas de peso, mais de cinco vezes acima do normal, colhidos de plantas desenvolvidas no Banco de Germoplasma. "Estamos buscando viveiristas parceiros para suprir a demanda de agroindústrias pela mudas", diz Schlindwein.

Butiazal na Fazenda São Miguel, em Tapes - Foto: Carmen Heller Barros/Especial/
Fazenda em Tapes abriga 70 mil butiazeiros - Localizada em Tapes, na Região da Costa Doce, a Fazenda São Miguel abriga hoje um dos maiores pomares de butiás do Estado e do país. A propriedade também é reconhecida pelo pioneirismo na conservação da planta natural do Rio Grande do Sul e por haver oferecido uma das primeiras áreas, ou a primeira, para estudos da Embrapa Clima Temperado sobre a palmeira. De acordo com a pesquisadora Rosa Lia Barbieri, estão contabilizados mais de 70 mil butiazeiros, da espécie odorata, distribuídos em 850 hectares da São Miguel.
Conforme descreve a própria Rosa Lia em uma publicação sobre a fazenda, os palmares são parte de um remanescente maior, que se estende por propriedades vizinhas, numa área de 2.997 hectares, onde foram identificados 307 mil butiazeiros adultos. São os mais extensos ecossistemas de butiazais de Butiá odorata do Brasil, que avançam também pelas terras do município limítrofe de Barra do Ribeiro. Considerados outros butiazais menores, não conectados com o remanescente maior, o total de butiazais nos dois municípios ocupa atualmente 4.037 hectares.
Na segunda metade dos anos 2000, a porteira da fazenda foi aberta para a Embrapa, propiciando um laboratório natural que estimulou notável avanço nas pesquisas. A iniciativa resultou, antes de tudo, da insistência de Carmen Heller Barros, herdeira, com dois irmãos e uma irmã, do empreendimento estabelecido há mais de 90 anos. Carmen diz ter uma "ligação espiritual" com os pomares, que inclusive fornecem matéria prima e inspiração para os florais que elabora sob a marca Butiazal Essências. "Quando entro neste butiazal, meu coração se enche de alegria, fico em paz e me sinto próxima do paraíso", descreve.
Carmen relata que, nos anos 2000, percebeu que não havia renovação das plantas, cujas mudas acabavam devoradas pelo gado criado na São Miguel. "Quando o butiazeiro nasce, surgem umas folhinhas que não são fibrosas, umas folhinhas ótimas que o gado vai lá e come", explica. Ao perceber o fenômeno, Carmen ou a "incomodar a família" para a adoção de alguma providência. Primeiro, obteve o apoio do pai. Depois, o irmão Napoleão, atual da São Miguel, decidiu procurar orientação na Embrapa, onde estabeleceu o primeiro contato com Rosa Lia.
De acordo com Carmen, a empresa de pesquisa aplicou na fazenda uma técnica utilizada no Uruguai, para convivência entre o rebanho e a planta. "Havia uma pesquisa no Uruguai que não tinha sido testada completamente. Usamos essa metodologia na nossa propriedade, em cerca de 50 hectares, com sucesso durante seis anos. Houve uma renovação significativa, com mais de seis mil novos pés de butiá", comemora Carmen.
*Matéria de Poti Silveira Campos - Correio do Povo Rural - 29/03/2025 - POA/RS.